Espírito do Gre-Nal
Eis agora uma opinião colorada. Irretocável...
Ímpia e injusta guerra
Por Luis Felipe dos Santos - 15/09/2007
Por Luis Felipe dos Santos - 15/09/2007
- Papai, quando começou essa guerra?
Pensei em dar uma resposta simplória. Começou em 1909, quando Antenor Lemos saiu da sede germânica tricolor vociferando palavrões e dizendo que queria ganhar do primeiro time deles. Minha filha jamais entenderia, mesmo se eu explicar toda a história do embate. Não foi Antenor Lemos que levou a pedrada na cabeça e o cara que a tocou não parecia nem um pouco alemão. Tampouco havia revide com foguetes de doze tiros, sirenes e cavalos da BM afastando multidões naquela época.
Muito triste ver aquela batalha campal no caminho entre o templo sagrado à margem do Guaíba e aquele outro estádio. As cassetadas dos policiais e os ferimentos das pedras não combinavam nem um pouco com o final de tarde ensolarado no domingo. Minha mãe avisara antes que eu não deveria nunca levar minha filha para um Gre-Nal. Também disseram isso todos os meus colegas de trabalho, os comentaristas na TV, os colegas da minha filha, os pais dos colegas dela, os professores, os astrólogos e a minha mulher.
Apesar de tudo, eu queria mostrar que um Gre-Nal não é apenas um jogo. É o maior significado possível a ser atribuído para o branco e o rubro. O momento no qual aquele estandarte, dividido com as cores da paz divina e da paixão flamejante, se torna muito mais do que o símbolo do time do coração. No Gre-Nal, vestir alvi-rubro é dar um rumo diferente à vida, é vestir um manto de fé, participar de uma oferenda ao maior dos deuses pagãos da Província de São Pedro – aquele cujo avatar é negro, fuma cachimbo e pula numa só perna. Usar o manto vermelho num Gre-Nal é um voto de adoração.
No estádio do rival, então, este voto tem um significado ainda maior. É um desafio à moral vigente, à maioria imposta, à rejeição suprema. Muitos daqueles que vestem tricolor e cruzam contigo, aos bandos, podem ser teus amigos, parceiros, em outras tantas situações. Entretanto, ao te ver vestindo encarnado, eles rangem os dentes e cerram os punhos. Tu enfrentas uma enorme e trovejante nuvem negra de desprezo: profanas o templo do rival e levas no seu grito a sua chance de derrota. Assistir a um Gre-Nal no Olímpico é a prova de fogo quanto ao teu desejo de ser realmente colorado.
Naquele caminho entre o Praia de Belas e a Azenha, não dá para ser apenas um torcedor: é necessário encarnar todo o espírito de virtude que norteou a gloriosa história colorada até hoje. Todos somos Antenor Lemos, ao enfrentar a arrogância e não desistir até vencê-la. Todos somos Carlitos, arremessando sem parar a bola rumo ao gol celeste. Todos somos Bodinho, mandando o goleiro tricolor parar de chorar e suportar calado os cinco gols. Todos somos Valdomiro, chutando faltas octacampeãs. Todos somos Nilson, fazendo um gol a mais com um atleta a menos. Todos somos Vicente Rao, dizendo que no fundo, eles queriam ser crioulos felizes como nós. Crioulos, macacos, que vestem o manto sagrado no templo profano e tantas vezes saem vitoriosos, carregando desafiadores sorrisos Carlos Barbosa adentro...
- Pai.
- Hum?
- Quando começou essa guerra?
- Do Gre-Nal?
- É.
- Acho que no momento em que esquecemos a nossa dignidade.
- Como assim?
- Ora, filha, o Gre-Nal nunca precisou de ódio para ser o maior jogo de todos. Quem leva o ódio para a partida simplesmente não é digno de uma festa tão bonita.
- Pai, quando que eu vou poder ir num Gre-Nal?
- Com um pouco mais de idade e o espírito tão desarmado quanto agora.
Seguimos a José de Alencar em direção à Praia de Belas, procurando um lugar seguro para ver o jogo pela televisão. Sinto uma pequena dor no coração que não passará tão cedo.
Pensei em dar uma resposta simplória. Começou em 1909, quando Antenor Lemos saiu da sede germânica tricolor vociferando palavrões e dizendo que queria ganhar do primeiro time deles. Minha filha jamais entenderia, mesmo se eu explicar toda a história do embate. Não foi Antenor Lemos que levou a pedrada na cabeça e o cara que a tocou não parecia nem um pouco alemão. Tampouco havia revide com foguetes de doze tiros, sirenes e cavalos da BM afastando multidões naquela época.
Muito triste ver aquela batalha campal no caminho entre o templo sagrado à margem do Guaíba e aquele outro estádio. As cassetadas dos policiais e os ferimentos das pedras não combinavam nem um pouco com o final de tarde ensolarado no domingo. Minha mãe avisara antes que eu não deveria nunca levar minha filha para um Gre-Nal. Também disseram isso todos os meus colegas de trabalho, os comentaristas na TV, os colegas da minha filha, os pais dos colegas dela, os professores, os astrólogos e a minha mulher.
Apesar de tudo, eu queria mostrar que um Gre-Nal não é apenas um jogo. É o maior significado possível a ser atribuído para o branco e o rubro. O momento no qual aquele estandarte, dividido com as cores da paz divina e da paixão flamejante, se torna muito mais do que o símbolo do time do coração. No Gre-Nal, vestir alvi-rubro é dar um rumo diferente à vida, é vestir um manto de fé, participar de uma oferenda ao maior dos deuses pagãos da Província de São Pedro – aquele cujo avatar é negro, fuma cachimbo e pula numa só perna. Usar o manto vermelho num Gre-Nal é um voto de adoração.
No estádio do rival, então, este voto tem um significado ainda maior. É um desafio à moral vigente, à maioria imposta, à rejeição suprema. Muitos daqueles que vestem tricolor e cruzam contigo, aos bandos, podem ser teus amigos, parceiros, em outras tantas situações. Entretanto, ao te ver vestindo encarnado, eles rangem os dentes e cerram os punhos. Tu enfrentas uma enorme e trovejante nuvem negra de desprezo: profanas o templo do rival e levas no seu grito a sua chance de derrota. Assistir a um Gre-Nal no Olímpico é a prova de fogo quanto ao teu desejo de ser realmente colorado.
Naquele caminho entre o Praia de Belas e a Azenha, não dá para ser apenas um torcedor: é necessário encarnar todo o espírito de virtude que norteou a gloriosa história colorada até hoje. Todos somos Antenor Lemos, ao enfrentar a arrogância e não desistir até vencê-la. Todos somos Carlitos, arremessando sem parar a bola rumo ao gol celeste. Todos somos Bodinho, mandando o goleiro tricolor parar de chorar e suportar calado os cinco gols. Todos somos Valdomiro, chutando faltas octacampeãs. Todos somos Nilson, fazendo um gol a mais com um atleta a menos. Todos somos Vicente Rao, dizendo que no fundo, eles queriam ser crioulos felizes como nós. Crioulos, macacos, que vestem o manto sagrado no templo profano e tantas vezes saem vitoriosos, carregando desafiadores sorrisos Carlos Barbosa adentro...
- Pai.
- Hum?
- Quando começou essa guerra?
- Do Gre-Nal?
- É.
- Acho que no momento em que esquecemos a nossa dignidade.
- Como assim?
- Ora, filha, o Gre-Nal nunca precisou de ódio para ser o maior jogo de todos. Quem leva o ódio para a partida simplesmente não é digno de uma festa tão bonita.
- Pai, quando que eu vou poder ir num Gre-Nal?
- Com um pouco mais de idade e o espírito tão desarmado quanto agora.
Seguimos a José de Alencar em direção à Praia de Belas, procurando um lugar seguro para ver o jogo pela televisão. Sinto uma pequena dor no coração que não passará tão cedo.
e-mail: luisfelipe@gmail.com
1 Comments:
Olha ,muito lindo o post , me lembra uma tirinha da zero hora do Radicci em cima do cavalo segurando uma bandeira da semana farroupilha no qual estava escrito : ORGULHO FARRAPO
O vo Nono falando pra Genoveva :
- Isso que perdemo a guerra! calcule se tivessemo ganho!!
rsrsrsrsr ;-)
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